O 7 A 1 NOSSO DE
CADA DIA, ONTEM E HOJE

15 meses depois do maior vexame do
futebol brasileiro em uma Copa do Mundo, nossa seleção voltou a jogar no último
dia 08 de outubro para iniciar a busca por uma vaga no próximo mundial a ser
realizado na Rússia, em 2018. Em partida realizada em Santiago, capital do
Chile, uma nova derrota, desta vez, para o vibrante selecionado local empurrado
por uma torcida igualmente vibrante.
Por mais que os grandes veículos de
comunicação (leia-se Rede Globo de Televisão) tentem mostrar que esta última
derrota e o 7 a 1 aplicado pela seleção alemã sobre a equipe brasileira em
terras mineiras em 2014 foram pontos fora da curva (o início de uma preparação,
um apagão), ambas dizem muito sobre o que somos, sobre os caminhos que
escolhemos seguir nos últimos décadas.
Ataque inoperante, meio de campo
medíocre expõem nossa defesa e muito mais que a nudez de um rei enganado pela
artimanha dos oportunistas de passagem. O 7 a 1 nosso de cada dia nos desnuda e
se traduz na cultura do condomínio e do shopping center, do Rock In Rio Balada
(RIR 2015, rir bastante!), na desvalorização do saber universitário, no
distanciamento do mundo real edulcorado nas redes sociais, na indignação e
humanitarismo seletivos (mãos cansadas ou ocupadas demais para bater panelas
para o Cunha? Haitianos negros e pobres são refugiados assim como sírios brancos
de boa formação acadêmica que aqui aportam?). E vamos que vamos.
*
Domingo, 13 de julho
de 2014 (licença para o auto-plágio porque há algo além do campo e bola)
Nos debates sobre o fim da Copa que
tomaram conta dos diversos canis de televisão, o assunto é o mesmo: os motivos
que levaram a Seleção Alemã de Futebol ao título do mundial realizado no
Brasil. Como historiador, recorro aos testemunhos do passado para oferecer
minha explicação, afinal, historia
magistra vitae (ou não?).
Há 20 anos, quando a Seleção
Brasileira de Futebol conquistava nos EUA sua quarta Copa do Mundo depois de um
longo e tenebroso jejum, o técnico Carlos Alberto Parreira desceu as escadas de
acesso da tribuna de honra do estádio Rose Bowl com o tão cobiçado troféu FIFA
nas mãos. Seguido pelos jogadores, Parreira oferecia o símbolo da conquista aos
torcedores brasileiros mais próximos e dizia: "Pode tocar que é nossa!".
Dedos anônimos se esticavam na esperança de se conectar ao troféu dourado tão
esperado.
Naquele momento e em outros
anteriores, havia uma maior proximidade com a população que abraçou e apoiou o
selecionado brasileiro em seus piores momentos. Lembremos da super goleada
contra a Bolívia em Recife ainda pelas Eliminatórias para a Copa de 1994 e do
nó tático sobre o Uruguai no Rio de Janeiro em tarde inspiradíssima do Baixinho
Romário. A plenos pulmões, os torcedores gritaram "Brasil". Bem, não
havia óculos Ray Ban para ajeitar, escova para não estragar e uniforme de grife
para não sujar...
No retorno triunfal depois da
conquista de 1994, a Seleção se jogou nos braços do povo que a tomou com
orgulho. Rojões cortavam os céus do país em um grito uníssono aos ouvidos do
mundo: éramos novamente os reis do futebol, a pátria de chuteiras.
Os anos se passaram, as
conquistas se acumularam. Jogadores foram alçados à condição de celebridades
acima do bem e do mal. Na proporção inversa, a proximidade de outrora transformou-se
em distância. Midiáticos e multimilionários, muitos de nossos jogadores voltaram
as costas para o povo, para os lugares de onde vieram e um dia viveram.
Na Copa disputada em terras
brasileiras (Copa que ainda não terminou para muita gente: alguém sabe dizer quando
finalmente funcionará o VLT de Cuiabá?), a distância chegou ao extremo. Cercada
de bajuladores ávidos por selfies cheias de sorrisos ensaiados e robustos pontos
na audiência, a equipe nacional se desconectou de vez de sua realidade, da matriz
cheia de vida cotidiana que gerou o nosso futebol. A lente de uma câmera
tornou-se mais importante que um treino. No fim, tudo acaba em samba? Em pizza?
Não, em balada!
O "povo" que a
aplaudia nossos craques reluzentes era formado por apresentadores globais de
plástico, gente oportunista e sem alma que provavelmente nunca derramou uma
lágrima pelo futebol, nunca pintou uma rua para a Copa ou queimou a pele sob o
sol forte de um estádio de futebol nesse Brasil de meu Deus. Nas nababescas arenas
padrão FIFA, as peles bem cuidadas, os caríssimos uniformes da Seleção, os óculos
escuros milimetricamente colocados e os dentes clareados eram maioria. O jogo
era um detalhe entre uma cerveja e outra comprada durante os noventa minutos de
bola rolando.
Enquanto isso, os alemães,
futuros campeões mundiais, fizeram o caminho contrário. Conheceram nossa gente,
a simplicidade de sua existência cotidiana. Em um mês no litoral da Bahia, aprenderam
um pouco de nossa cultura. Cantaram e dançaram as nossas músicas! (não estou
falando de sertanejo universitário, funk proibidão e outras coisas do gênero). Eles
foram mais brasileiros do que a nossa seleção de vitrine. O resultado foi visto
em campo entre os dias 12 de junho e 12 de julho: um bando de jogadores
assustados, distante do título e de seu povo. Nossa força não estava mais com
eles...
De volta ao presente dos presentistas
Um novo prédio corta o céu.
Condomínio fechado como as castas a se engalfinhas na Internet. Escolas que se
fecham. Farmácias e salões de beleza que se multiplicam exponencialmente. O
não-lugar nos consome. Por que melhorar coletivamente se posso pagar por aquilo
que desejo? O barro pode ser comprado em uma bela caixa de acrílico, na sola dos
pés jamais! Ciclovia? Apenas a que se vê pelo vidro do carro de portas
hermeticamente lacradas. E as distâncias só continuam a aumentar. A que existe entre a Seleção Brasileira de Futebol e seu povo é simplesmente mais uma delas.
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